Carta Aberta da Clemaarj denuncia ameaça de colapso ambiental no país

O documento é assinado por 155 entidades que realizaram a Conferência Livre Estadual do Meio Ambiente e Agricultura (Clemaarj 2022), no sábado (25), em Niterói, e relaciona o conjunto de ataques, retrocessos e riscos impostos ao setor.

As 155 entidades da Conferência Livre Estadual do Meio Ambiente e Agricultura (Clemaarj 2022), realizada no último sábado (25), no Teatro Oscar Niemeyer, em Niterói, denunciaram em carta aberta a crise que poderá levar ao colapso ambiental do país. O quadro dramático é resultado de ataques às instituições de governança e às políticas públicas do setor, e do modelo econômico ultra predador dos recursos naturais e dos direitos sociais, afirmam os participantes, que também promovem, nesta quarta (29), uma Festa Junina e Ato Público Ambiental, na Praça XV, com 45 barracas de sindicatos, movimentos sociais, organizações ligadas a diferentes frentes de luta, de juventude, de mulheres, de educação e cultura, da agroecologia, ativistas e ambientalistas, políticos e lideranças sociais (veja aqui).

“A Clemaarj denuncia que as forças motrizes da destruição ambiental estão centradas em uma política neoliberal, que acentua desigualdades sociais, balizadas nas ações das grandes corporações, dos interesses predatórios do agronegócio, das mineradoras e do sistema financeiro, que produzem o desastre socioambiental e acentuam a vulnerabilidade dos estados, através de privatizações de empresas que têm a água como base de sua produção (Cedae e Eletrobras), entre outras, e intensifica o processo erosivo das políticas públicas e dos órgãos públicos”, afirma a Carta Aberta da Clemaarj 2022, assinada pelo Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge RJ), pelo Fórum Estadual de Engenheiros Agrônomos (Feea-RJ), Crea-RJ/CMA, Observatório Nacional do Direito à Água e ao Saneamento (Ondas), CUT-RJ, APSERJ, Abio, Aprogeo-RJ, Ecocidade/Apedema-RJ, Baía Viva, Defensores do Planeta, Fetagri-RJ e Sindsprev, entre outras instituições. “Alertamos que o produto desta destruição é a crise ecológica (ambiental), que avança para um colapso ecológico (ambiental).”

A Conferência abordou 15 temas, relacionados a diferentes frentes de luta e organizações do movimento social, numa articulação bastante diversificada de forças em torno de uma causa comum. Foram produzidos documentos sobre água e saneamento, resíduos sólidos, agricultura e agroecologia, energia, dívida pública, mudanças climáticas, educação ambiental, justiça ambiental, cannabis medicinal, meio ambiente e suas relações com a juventude, as mulheres, o esporte, as formas de resistência, agricultura urbana. Em quase todas as apresentações, que estarão disponíveis no site da Conferência, o quadro é de perdas, ameaças e riscos.

“A Clemaarj repudia os retrocessos na gestão socioambiental, as mortes de ativistas, o fechamento dos espaços de controle social, os ataques aos direitos humanos, direitos indígenas, dos negros, das mulheres e LGBTQIA+ e a criminalização dos movimentos sociais”, escrevem os signatários.

Eles destacam o fechamento dos Departamentos de Educação Ambiental nos Ministérios da Educação (MEC) e do Meio Ambiente (MMA) e o abandono pelo Brasil dos compromissos assumidos no Acordo de Paris, na Convenção de Minamata, da Agenda Brasileira de Mudanças Climáticas, dos Biomas, em especial da Amazônia e do Cerrado brasileiro. No âmbito do governo do Estado do Rio de Janeiro, criticam a inação do Grupo Interdisciplinar de Educação Ambiental (GIEA), que não se reúne há quatro anos, e a não implementação da Política Estadual de Mudanças Climáticas.

A Carta Aberta da Clemaarj 2002 aponta, ainda, “a flexibilização da legislação ambiental, o desmantelamento das instituições, o negacionismo científico, a intensificação dos processos de degradação ambiental, desmatamento, queimadas, contaminação das águas pela mineração e garimpos clandestinos, aumento na liberação e uso de agrotóxicos, grilagem de terras, matança do povo negro, violações dos direitos dos povos indígenas, violência e assassinatos na floresta, no campo e na cidade”.

Ataques no Rio de Janeiro
Durante a conferência, os debates abordaram problemas que atingem diretamente o Rio de Janeiro. Com relação ao estado, a carta condena os“empreendimentos que degradam as águas continentais e da orla marítima, as Baías de Guanabara, de Sepetiba e Ilha Grande, entre outras lagoas do Rio de Janeiro, transformando-as em pátios industriais, com graves impactos socioambientais, atingindo os povos das águas – pescadores artesanais, marisqueiras, ribeirinhos, caiçaras e outros – que possuem relação umbilical com os ecossistemas aquáticos e sofrem violações de direitos e crise de destino”.

Os signatários observam que o artigo 269 da Constituição do estado do Rio estabelece as Baías de Guanabara, Sepetiba e Ilha Grande como áreas de relevantes interesses ecológicos, cuja utilização dependerá de prévia autorização dos órgãos competentes, preservados seus atributos essenciais, impedindo, entre outras ações, a instalação de termelétricas.

No território fluminense, outra questão grave está relacionada à Lei Nacional de Resíduos Sólidos e aos lixões que contaminam áreas de populações pobres e servem de fonte de receita ao crime organizado, em particular às milícias. Os participantes da Conferências pedem, nesse sentido, a aprovação urgente de um plano de gestão integrada de resíduos que, na sua concepção e no seu acompanhamento, garanta a participação social.

Todos os participantes ressaltaram a necessidade de “mobilização e a articulação social permanentes”, no esforço de reconstruir o país, com ações amplas de educação ambiental. Entendem, em síntese, que a crise ambiental deriva de um projeto rentista, que prioriza ganhos financeiros e hiper exploração em todos os campos. Defendem, assim, a revogação da Lei Kandir (que sufoca a capacidade de investimento dos estados) e o congelamento do teto dos gastos (Emenda Constitucional 95).

“Essa mobilização permanente exige a ampliação da educação ambiental, cultural e política da nossa população com a renovação das nossas lideranças, comprometidas com as temáticas: biodiversidade; gênero, água e saneamento; étnico-racial; e de classe”, diz a carta. “Vamos manter a sociedade em mobilização permanente, indo além dos períodos eleitorais, na medida em que nossa organização nos exigirá novas lutas, em outro patamar. A mobilização em um futuro próximo objetiva resgatar o que foi perdido, reconstruir o que foi destruído, eliminar os retrocessos configurados através de leis parciais, desiguais e injustas.”

Nas eleições de 2022, os signatários querem que “governantes e parlamentares assumam um claro compromisso e responsabilidade com a execução e fortalecimento de políticas públicas ambientais e agrícolas, com a defesa das instituições, sistemas nacionais de proteção social e do SUS, com a garantia da participação e do controle social, com a redução das desigualdades, defesa do estado de direito e da democracia participativa.”

A Clemaarj contou com representantes de 240 instituições inscritas. Além da Carta Aberta da Clemaarj 2022, foi aprovada uma outra carta, pedindo justiça e punição aos mandantes e assassinos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britâncio Dom Phillips, e várias moções, entre elas um protesto à privatização da Petrobras: “Se até agora a PBIO não foi vendida, foi graças à luta intensa dos trabalhadores, junto com os Sindicatos dos Petroleiros do Rio de Janeiro, de Minas Gerais e da Bahia. A PBIO deve ser parte do sistema Petrobras e controlada pelo povo para servir à soberania energética e alimentar do Brasil. Apoiamos integralmente a luta dos trabalhadores contra a venda dessa subsidiária. Tudo isso ganha ainda mais corpo, agora, com Lira e Bolsonaro defendendo abertamente a privatização total da empresa. Repudiamos veementemente a entrega da Petrobras, que pode ser o nosso passaporte para o futuro, financiando a transição energética, a pesquisa e implementação de renováveis, além da geração de empregos, saúde e educação.”

> Carta Aberta da Clemaarj 2002  

> Carta pela Justiça quanto ao assassinato de Bruno Pereira e Dom Phillips pela Defesa da vida indígena, fortalecimento das políticas públicas socioambientais e contra o marco temporal no Brasil. 

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