Livro, site e fórum querem levar a engenharia do trabalho às graduações

A iniciativa é uma parceria do Ministério Público com universidades, e visa reduzir acidentes de trabalho, agregando conteúdos sobre saúde, segurança, ergonomia e projeto em todas as engenharias.

Resultado de uma demanda do Ministério Público do Trabalho (MPT), uma série de iniciativas visa integrar ao ensino de todas as engenharias os conteúdos relacionados à engenharia do trabalho. Para isso, foi criado um site de referência – http://engenhariadotrabalho.com.br –, já no ar, e está programado para agosto o lançamento do livro “Engenharia do trabalho: saúde, segurança, ergonomia e projeto” (Editora Ex-libris), com artigos de 51 especialistas. No segundo semestre, acontece, ainda, a terceira edição do Fórum de Engenharia do Trabalho, um dos muitos encontros promovidos recentemente com entidades setoriais e sindicais para abordar o tema.

A engenharia do trabalho é uma área do conhecimento que desenvolve modelos de produção e projetos de prevenção de acidentes, sempre priorizando a segurança do trabalhador. Cobre quatro campos: saúde; segurança do trabalho; ergonomia; projeto do trabalho. Seu objetivo é que as pessoas estejam protegidas em qualquer relação de trabalho, no setor de serviços, na indústria, na interação com máquinas, em todas as atividades. “A área é pouco conhecida no Brasil, como acontece em sociedades de base escravocrata, hierarquizadas, onde o capital prevalece a níveis extremos, e em que os elementos do trabalho são negligenciados e colocados em segundo plano”, explica Raoni Rocha Simões, professor do Departamento de Engenharia de Produção na Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop).

Raoni é um dos idealizadores do projeto “Engenharia do Trabalho” para o MPT, junto com os professores Daniel Braatz, do Departamento de Engenharia da Produção da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), e Sandra Gemma, da Faculdade de Ciências Aplicadas da Unicamp-Limeira. Tudo começou há dois anos, quando o MPT, na 15ª vara, em Campinas (SP), desenvolveu uma ação promocional destinada à prevenção de acidentes na construção civil. Com apoio técnico do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest) da região de Piracicaba (SP) e apoio administrativo da Organização ASAS, o ministério reuniu docentes para produzir materiais didáticos e eventos que permitissem uma maior difusão do mundo do trabalho em cursos de engenharia.

Novos caminhos para a prevenção
A semente para a construção dessa rede de ação foi a inquietação dos profissionais do Cerest de Piracicaba provocada por investigações feitas em acidentes de trabalho em altura. Em julho de 2013, em uma obra do anel viário às margens da rodovia que liga Piracicaba a Limeira (SP), dez homens que trabalhavam na construção da ponte sofreram um acidente. Dois anos depois, outro acidente emblemático para a equipe ocorreu com dois trabalhadores, carpinteiros, que se preparavam para tirar pedra de concreto presa em uma tela de proteção na bandeja lateral de uma edificação a 35 metros de altura. Um dos trabalhadores morreu na queda, ao tentar uma mudança de nível usando uma escada manual pequena, no espaço livre formado entre a bandeja e a janela da escadaria. Ele era integrante da CIPA e reconhecido como bastante cuidadoso com relação às questões de segurança do trabalho.

Com o propósito de encontrar novos caminhos para a redução de acidentes do trabalho com óbitos, o técnico de Segurança do Cerest Alessandro José Nunes da Silva enviou um ofício ao procurador do trabalho da 15ª Região, Silvio Beltramelli Neto, solicitando apoio para um projeto de prevenção de acidentes de trabalho contra queda de altura. Essa ação envolveu diálogos com diversos outros parceiros e docentes universitários, e a instauração de um procedimento promocional cuja primeira reunião ocorreu em março de 2016. Nesse trabalho coletivo, identificaram a “necessidade expressiva de intervenção na formação em Engenharia”.

“Isto porque, para aqueles e aquelas que investigam o acidente de trabalho, é evidente o papel da Engenharia como um campo transformador, e presente em toda a atividade humana, mas que, ao mesmo tempo, seus profissionais são majoritariamente carentes de uma percepção mais orgânica e integrada sobre a preservação da saúde e integridade física no trabalho, desde o início de sua formação”, informa o texto de apresentação no site do projeto. A iniciativa busca dar novo sentido ao termo Engenharia do Trabalho, desenvolvendo conteúdos e estratégias para incorporar ao ensino de graduação de todas as engenharias um saber integrado entre planejamento, projeto, saúde e segurança do trabalho.

“Quando a gente chega nas indústrias, os responsáveis pelas organizações, as chefias, são em geral engenheiros”, conta Raoni. “A grade curricular da engenharia tem várias disciplinas de gestão, inovação, mas, quando se vai no campo, os gestores não têm formação na área do trabalho. E essa é uma das razões para o Brasil ocupar um dos primeiros lugares do mundo em acidentes de trabalho, segundo o Observatório do Trabalho do MPT.”

O livro, com lançamento previsto para agosto, reúne engenheiros, pessoal de saúde pública, especialistas em sociologia do trabalho, economistas, profissionais do Direito. Estará disponível no site para download gratuito e será distribuído a universidades, bibliotecas, empresas, sindicatos. A intenção, destaca Raoni, não é criar uma nova disciplina nem uma associação, mas atuar diretamente na formação dos estudantes de todas as especializações.

Foto: Pixabay

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